A BELA ADORMECIDA

Estou alegre e o motivo beira secretamente à humilhação, porque aos 50 anos não posso mais fazer curso de dança, escolher profissão, aprender a nadar como se deve.

No entanto, não sei se é por causa das águas, deste ar que desentoca do chão as formigas aladas, ou se é por causa dele que volta e põe tudo arcaico, como a matéria da alma.

 Se você vai ao pasto, se você olha o céu, aquelas frutinhas travosas, aquela estrelinha nova, sabe que nada mudou.

O pai está vivo e tosse, a mãe pragueja sem raiva na cozinha.

Assim que escurecer vou namorar.

Que mundo ordenado e bom!

Namorar quem?

Minha alma nasceu desposada com um marido invisível.

Quando ele fala roreja quando ele vem eu sei, porque as hastes se inclinam.

Eu fico tão atenta que adormeço a cada ano mais.

Sob juramento lhes digo:
tenho 18 anos. Incompletos.

Adélia Prado

 

 

 

 

   

 

 

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